Fístulas arteriovenosas pulmonares
O que é uma fístula arteriovenosa pulmonar?
Uma fístula arteriovenosa pulmonar (FAVP) é uma situação anormal onde existe uma conexão potencialmente problemática entre uma veia e uma artéria no pulmão. Esta conexão age como um desvio da rota normal que o sangue deveria seguir.
Como surgem as fístulas arteriovenosas pulmonares?
As fístulas arteriovenosas pulmonares são malformações congênitas, ou seja, elas surgem à medida que a criança se desenvolve no útero e já estão presentes ao nascimento, mas nesta época ainda não são detectadas pelo seu pequeno tamanho. São um pouco mais frequentemente em mulheres do que em homens. À medida que a pessoa cresce, a lesão torna-se detectável.
As fístulas arteriovenosas pulmonares podem aparecer sozinhas, independentemente de uma doença subjacente. Todavia, pessoas com telangiectasia hemorrágica hereditária (THH), antigamente conhecida como doença de Rendu-Osler-Weber, podem apresentar vasos sanguíneos anormais em diferentes partes do corpo, incluindo os pulmões. Estima-se que a maioria dos indivíduos com FAVPs tenha THH.
Pacientes com THH podem apresentar, além das fístulas pulmonares, fístulas e malformações arteriovenosas em outras partes do corpo: cerebral, nasal, hepática e de todo o sistema digestivo. As fístulas pulmonares também podem ser uma complicação de lesões pulmonares, como traumas, tumores ou infecções, embora essas causas sejam muito menos comuns.
O que as fístulas arteriovenosas pulmonares podem provocar?
Esses vasos anormais transportam o sangue para fora do pulmão antes que ele seja oxigenado. O processo é denominado “shunt sanguíneo da direita para a esquerda”. Em muitos casos, não há sintomas. Em casos mais sérios, essa situação pode privar o corpo de oxigênio e causar várias complicações.
Se não forem tratadas, essas fístulas também podem levar a um quadro chamado “embolia paradoxal”: um coágulo de sangue que se forma nos pulmões e migra pelos vasos até se alojar em outra parte do corpo, como braços, pernas e cérebro.
O que os pacientes com fístulas arteriovenosas pulmonares podem sentir?
Cianose: dedos das mãos e pés ficando azulados
Baqueteamento digital: dedos e dedos das mãos ficando inchados ou aumentados
Alteração no som normal da respiração ao exame de ausculta pulmonar, chamado "sopro"
Epistaxe: hemorragias nasais em pacientes com THH
Dificuldade na respiração
Cansaço exagerado durante exercícios físicos
Nos casos mais graves, onde ocorreu a embolia paradoxal, os pacientes podem ter sintomas relacionados ao local onde se alojou o coágulo, como dor, frialdade e escurecimento de extremidades (dedos das mãos, pés ou outras partes do corpo). A complicação mais temida é o AVC, que ocorre quando o coágulo se aloja em uma artéria cerebral. Os sintomas variam com a região do cérebro que é afetada, destacando-se:
Alterações da fala, com dificuldade de formar as palavras e compreender o significado
Alterações da força em um dos lados do corpo, afetando o braço, pernas e até o rosto.
Perda repentina do equilíbrio
Alteração súbita da visão
Alteração do nível de consciência (desmaios)
Qual a relação das fístulas arteriovenosas ao AVC?
As fístulas podem fazer que coágulos formados nos pulmões migrem pelos vasos sanguíneos e atinjam alguma artéria cerebral, levando à sua obstrução. A obstrução das artérias causa redução da circulação com consequente morte do tecido cerebral afetado, a chamada isquemia ou infarto cerebral. A essa condição, damos o nome de acidente vascular cerebral isquêmico (AVCi). Leia mais sobre AVC: "AVC isquêmico".
Como é o diagnóstico das fístulas arteriovenosas pulmonares?
O diagnóstico geralmente é levantado quando o paciente tem um ou mais dos sintomas relacionados ou história familiar de THH.
Uma vez suspeitada a presença da doença, além do exame físico que busca ouvir o "sopro" anormal nos pulmões, podem ser realizados exames laboratoriais para verificar se o nível de oxigênio no sangue está baixo ou se a contagem de glóbulos vermelhos no sangue está alta, achados comuns nos pacientes com fístulas. Em seguida, podem ser realizados os seguintes exames de imagem:
Radiografia de tórax
Tomografia computadorizada
Angiografia pulmonar por cateter, também chamada de arteriografia pulmonar.
A angiografia por cateter ou arteriografia é o melhor exame para o diagnóstico definitivo das fístulas arteriovenosas pulmonares. Ele permite o estudo detalhado dos vasos sanguíneos da região, facilitando o planejamento do tratamento. Leia mais sobre as angiografias aqui: "As dúvidas mais comuns sobre o exame de angiografia por cateter".
Em alguns casos, pode acontecer o diagnóstico incidental: no exame radiográfico do tórax as fístulas arteriovenosas podem aparecer como "nódulos", levando à investigação e diagnóstico de fístula.
Como é o tratamento das fístulas arteriovenosas pulmonares?
As pequenas fístulas arteriovenosas pulmonares podem não exigir tratamento algum. Na maioria dos casos, entretanto, essas fístulas precisam ser corrigidas. Existem dois tratamentos usados e cada caso deve ser avaliado para escolher qual alternativa é melhor.
Cirurgia para remover o vaso sanguíneo anormal e o tecido pulmonar ao redor;
Embolização (no momento da arteriografia).
Como é a embolização das fístulas arteriovenosas pulmonares?
O termo "embolização", na medicina, se refere ao procedimento de ocluir (fechar, estancar) um vaso sanguíneo de forma controlada. Na embolização pulmonar, o médico Radiologista Intervencionista usa um pequeno cateter, geralmente inserido pela região da virilha ou do braço, até a circulação do tórax. Por meio do cateter, são injetados materiais que servem para “estancar” (ou embolizar) a região da fístula. Esse procedimento geralmente é realizado sob anestesia geral, pois requer controle sobre a respiração do paciente.
A grande vantagem do tratamento com embolização se dá no fato de que não é preciso remover o tecido pulmonar normal. Como é tratada apenas a área doente da circulação, é possível preservar grande parte do pulmão normal. Essa técnica tem muito valor nos pacientes com múltiplas fístulas, afetando grande parte do pulmão. Neles, é possível que a cirurgia seja contra-indicada justamente por requerer retirada de grande quantidade de tecido saudável, com potenciais problemas respiratórios futuros.
É importante consultar o médico Radiologista Intervencionista, área especialista nesse tipo de tratamento. Após avaliação de cada paciente, é ele o profissional que indicará ou não a sua realização, bem como orienta sobre os passos importantes a tomar antes e após o tratamento.
Referências:
Embolisation for pulmonary arteriovenous malformation - https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6491094/
Escrito por:
CRM/SP 121.017 - RQE 38.296/38.297
Atualmente um dos diretores da Sociedade Brasileira de Radiologia Intervencionista e Cirurgia Endovascular (SOBRICE), entidade representativa da especialidade